Toda lição é de casa. Uma ensina a aprender
outra aprende a ensinar. Não sei para quando
será a viagem. Não sei se parti, se já estou
de regresso nem se a lição é de fato minha,
dos pombos que giram no telhado ou do silêncio
entre o sussurro de Monk & o sopro de Mulligan
no meio da sala: ‘Round midnight.
Lá fora(
sol alto) lição interrompida. O sal da lição?
Não saber. Sabida, lição já não é.
Naquele
tempo eu viajava para longe, toda semana.
Um dia estranharam minha alegria ao partir.
“É tão bom assim?” “Não, é que aprendi
a antegozar o prazer da volta.” Nada se iguala
ao alívio antecipado do dever cumprido. A casa
acumula todas as lições: ontem, hoje – o mesmo
tempo a escoar entre o já-não-mais e o ainda-
não – centro de tudo o que sou ou tenho. Mas não
tenho: a casa o contém. E não há lição que o
detenha.
O que tenho é um retrato na parede
: um menino me fita apaziguado, seu olhar
se dissolve na brisa. Escancaro as janelas
e o calor da tarde me lembra: outono se foi,
inverno se foi, primavera aí vem ( o rendilhado
de Monk prossegue & o sopro agudo de Mulligan).
Outra primavera: midday midnight. O menino
salta do retrato, se aninha no sofá e me lembra
a sorrir: é hora de voltar a lição interrompida.
Sorrio que sim, à sombra do jasmineiro
em flor.
É tarde. Não sei a lição (há pouco
estava no jardim). Como enfrentar classe
tão avançada? A sombra se adensa, é noitinha.
O olhar do menino me fita, não sei se do retrato
ou do canto do sofá onde se aninha,
não sei
se do olho iluminado da noite, e sorri. Sorrio
que sim. É a hora. (Monk &Mulligan insistem
agora sim: ‘Round midnight. Lição de casa.) (MOISÉS, 2008, pp. 44-45)
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