quinta-feira, 29 de março de 2012

Ficção de origem, de Marcos Siscar, em O roubo do silêncio(2006)

1.
Naquele dia, a água perdeu o fundo e a margem se
afastou.Da vertigem, restaram-lhe apenas os cabelos
grossos, o inequívoco futuro anterior do que terá se
tornado vida; da queda, a miragem, um espectro en-
tre folhas de mangueira; do cadáver, a ausência pre-
sente, a catacrese do impensável; do vôo, a levitação,
o movimento simulando o desejo; da velocidade, ape-
nas a flor sem geometria.Mas veja. A morte pentean-
do seus longos cabelos castanhos, de uma beleza de
encostar a cabeça no seu colo, senta-se junto da mesa e
conta histórias antigas, imemoriais. Silêncio, é preci-
so ouvi-la, a ela apenas a palavra morde, a ela apenas o
destino aprecia. Não basta vida. Começa no fim a
origem da arte a que chamarei vitalidade.
SISCAR, Marcos. O roubo do silêncio. Rio de Janeiro: 7 letras, 2006, p.31.

segunda-feira, 12 de março de 2012

fragmentos de Visão 1961, de Roberto Piva, em Paranóia

[...]

minhas [...]

na solidão[...]

noite profunda[...]

já é quinta-feira]...]

os banqueiros[...]

[...]

segunda-feira, 5 de março de 2012

Cinderela, de Fabio Weintraub, em Novo Endereço

mesma esquina:
a velha enrola bobes
na imunda peruca

o batom transborda a boca
onde a prótese emprestada
oscila

garis caçoam

descalça e crédula
órfã de fadas
sorri-me a velha

há bailes além do borralho

(WEINTRAUB,2002, p.34)

Celebridade, de José Paulo Paes, em Socráticas

para Raduan Nassar

Eu sou o poeta mais importante
da minha rua.

(Mesmo porque a minha rua
é curta.)

(PAES,2001, p.37)

quinta-feira, 1 de março de 2012

sobre o nada, proteu

para falar a verdade o único poeta árcade que conheço
ouvi falar é verdade é um tal de sei lá um poeta heterônimo
de um tal de fernando caeiro parece que reis num sei talvez
dia de rei num cemiteriozinho sem transcendia à espera
de alguém que o estude leia-o pelo menos para que assim
presentifique-se ou coisa parecida alguma coisa com a verdade
dessa expressão verdade árcade poeta mentira amor enume´-
ração pastor ficção barroco( às margens de um rio) e o cansaço
de terminar esta conversa
que surgiu de um pombo querendo a pomba e a pomba não quis o
pombo que na cópula tombou voou outro pombo querendo –a
pousou não tombou e que não surja ninguém metido à besta
falando em orfeu roufenho